‘A Maria da Penha me transformou num monstro’
Quem é, como vive e o que pensa o homem condenado por tentar matar a brasileira que deu nome à lei que combate a violência contra a mulher no País. Quase 28 anos depois do crime, ele fala pela primeira vez
Por Solange Azevedo, da ISTOÉ:
O economista colombiano Marco Antonio Heredia Viveros chega sorrateiro. Pele bronzeada. Sorriso discreto. Testa alongada pela calvície. Puxa uma pequena mala preta de rodinhas apinhada de papéis. Na outra mão, traz uma pasta surrada estilo 007. Caminha de maneira altiva. Sem olhar para o chão. De camisa azul-clara – mangas compridas, poída, quase colada ao corpo – e calça bege, parece em forma.
Declara ter 57 anos, apesar de documentos antigos apontarem sete anos a mais. Com sotaque carregado e depois de me dar um forte e inesperado abraço, Heredia pergunta: “Fez uma boa viagem?”. Durante as nove horas de entrevistas – somadas a uma sessão de fotos e a uma extensa troca de e-mails – ele tenta se mostrar cortês e inofensivo. Pensa em cada frase. Quando foge do script e escorrega nas palavras, respira demoradamente e sorri. Me chama de “meu anjo” e “querida amiga”. “Não sou o que as pessoas pensam”, afirma. “A Maria da Penha me transformou num monstro. Não tentei matá-la. O único erro que cometi foi ter sido infiel. Por isso, ela armou toda essa farsa. Essa mulher é um demônio.”
– Você cita Maria da Penha com muita raiva…
Heredia não deixa o raciocínio ser concluído e reage:
– Não é raiva. É objetividade. É verdade. Sinto pena dela. Se eu sinto pena, não posso sentir raiva.
Heredia vive solitário, enfurnado em 12 metros quadrados de um quarto de pensão, na periferia de Natal. Mantém pouquíssimos contatos com os vizinhos. Apenas a dona da hospedaria sabe quem ele é. O funcionário da lan house, onde Heredia se corresponde com familiares da Colômbia, não faz ideia de que ele seja um ex-presidiário. A balconista da mercearia, que lhe vende fiado, também desconhece o seu passado. “Não aceito que ninguém entre um centímetro na minha vida.
Tiro a pessoa pelo pescoço”, garante Heredia. Ele decidiu se mudar para o Rio Grande do Norte em meados da década de 80, quando o cotidiano na capital cearense ficou insuportável. Partiu em busca do anonimato. Em Fortaleza, cidade onde morava com a biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes e as três filhas do casal, ele era apontado na rua como o criminoso que acertou um tiro na espinha da mulher e a deixou paraplégica. Uma mulher que, anos mais tarde, se tornaria o símbolo do combate à violência doméstica no Brasil e viraria nome de lei.
Por Solange Azevedo, da ISTOÉ:
O economista colombiano Marco Antonio Heredia Viveros chega sorrateiro. Pele bronzeada. Sorriso discreto. Testa alongada pela calvície. Puxa uma pequena mala preta de rodinhas apinhada de papéis. Na outra mão, traz uma pasta surrada estilo 007. Caminha de maneira altiva. Sem olhar para o chão. De camisa azul-clara – mangas compridas, poída, quase colada ao corpo – e calça bege, parece em forma.
Declara ter 57 anos, apesar de documentos antigos apontarem sete anos a mais. Com sotaque carregado e depois de me dar um forte e inesperado abraço, Heredia pergunta: “Fez uma boa viagem?”. Durante as nove horas de entrevistas – somadas a uma sessão de fotos e a uma extensa troca de e-mails – ele tenta se mostrar cortês e inofensivo. Pensa em cada frase. Quando foge do script e escorrega nas palavras, respira demoradamente e sorri. Me chama de “meu anjo” e “querida amiga”. “Não sou o que as pessoas pensam”, afirma. “A Maria da Penha me transformou num monstro. Não tentei matá-la. O único erro que cometi foi ter sido infiel. Por isso, ela armou toda essa farsa. Essa mulher é um demônio.”
– Você cita Maria da Penha com muita raiva…
Heredia não deixa o raciocínio ser concluído e reage:
– Não é raiva. É objetividade. É verdade. Sinto pena dela. Se eu sinto pena, não posso sentir raiva.
Heredia vive solitário, enfurnado em 12 metros quadrados de um quarto de pensão, na periferia de Natal. Mantém pouquíssimos contatos com os vizinhos. Apenas a dona da hospedaria sabe quem ele é. O funcionário da lan house, onde Heredia se corresponde com familiares da Colômbia, não faz ideia de que ele seja um ex-presidiário. A balconista da mercearia, que lhe vende fiado, também desconhece o seu passado. “Não aceito que ninguém entre um centímetro na minha vida.
Tiro a pessoa pelo pescoço”, garante Heredia. Ele decidiu se mudar para o Rio Grande do Norte em meados da década de 80, quando o cotidiano na capital cearense ficou insuportável. Partiu em busca do anonimato. Em Fortaleza, cidade onde morava com a biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes e as três filhas do casal, ele era apontado na rua como o criminoso que acertou um tiro na espinha da mulher e a deixou paraplégica. Uma mulher que, anos mais tarde, se tornaria o símbolo do combate à violência doméstica no Brasil e viraria nome de lei.
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